quinta-feira, 24 de novembro de 2016

A Cultura de terno e gravata

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A Cultura de terno e gravata
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Representantes eleitos, e escolhidos pelos seus principais, vestem seus ternos e viajam para Brasília. Não se importam com o tempo gasto, as escalas necessárias, e as distâncias. Partem de Natal, necessitando de um transporte para chegar em um aeroporto distante (lembrando os holandeses NAT: New Amsterdam Terminal). Um terminal em outro município, por estradas não terminadas e não sinalizadas. Embarcam em equipamentos aéreos, escolhendo entre Boeing e Airbus de JJ, AV, ou G3;  do B737 ao B777, do A320 ao A380. Seus assessores, providenciam tudo: passagens, traslados, alimentação e estadia.

Embarcam com a possibilidade de fazer uma escala, transbordo ou transferência em GRU ou CGH, raramente em VCP, para chegar a BSB. Podem até necessitar de um deslocamento terrestre, atravessando marginais de rios, no conturbado trânsito de São Paulo, para trocar de aeroporto, prosseguindo a viagem. Mas querem mesmo, é chegar em Brasília para fazer uma foto e colocar em redes sociais, para dizer que estão trabalhando em nome de uma cidade, em nome de um povo, e em nome da cultura. É pelo olhar do outro que percebemos e identificamos a nossa existência, e a partir desta teoria, esbanjam as fotos, para que seus seguidores vejam, compartilhem e curtam. Ver, curtir e compartilhar, a regra básica dos amigos.

Uma foto em um sofá de cor branca, limpíssima, alvíssima, que destaque seus ternos, encenados por um corpo vivo, e suas poses com sapatos engraxados, provavelmente na porta, antes da entrada, prevendo uma foto, que mostrem seus pés, na cor neutra de sapatos e meias. São todos iguais da cabeça aos pés, um comportamento robotizado, ao controle do Big Brother, que comanda por uma telinha, desde 1984.

E desembarcando em Brasília, precisam de transportes e acomodações, um traslado, em carro fechado com ar condicionado, não usam transportes coletivos, nem em sua cidade. Precisam de um local, para no mínimo uma pernoite. Um local para se refazerem de uma viagem. Fazer um lanche, podem estar cansados de comer amendoins, e algumas barrinhas de cereais. Precisam de um banho e de mudarem de roupas, para então atravessar a cidade planejada e construída no Planalto Central, as margens de um lago artificial Tudo é artificial em Brasília, da paisagem aos prédios. Precisam inclusive se precaver em não deixar seus lábios rachados, dada a secura das coisas, do ambiente e das pessoas. A artificialização que influencia os comportamentos. Ali encontramos homens produzidos em série, com ternos e gravatas de cores sóbrias, com paletó e gravata, engomados e endurecidos, no estilo impecável. E com ares de sérios, vão ali discutir assuntos restritos, em lugares fechados, o destino de um povo. Mas não é possível discutir a cultura, já que ela mesma traça os seus caminhos. E tudo corre, voa e anda, é deglutido e defecado, pago com o suor do povo.

Na foto um trio de nordestinos, sem gibão e sem chapéu de couro, sem chinelos ou alpercatas, que registrem uma cultura em seus corpos, produzida pelos séculos, que se plantaram na terra. Sentados em ambientes confortáveis para discutir e negociar a cultura de um povo. Um estado onde existem cidades e bairros, que eles não conhecem as ruas e avenidas. Desfilam a pé com seguranças e fotos, na tentativa de mostrar que fazem parte do povo. Andam a pé com suas esposas, à frente da procissão para ser o primeiro plano, ao tirar uma foto. Querem se destacar entre os eclesiásticos, na romaria da padroeira da cidade. Uma antiga parceria da igreja e do estado.

A cultura emana de um povo, e por ele se perpetua. Surge em um local de acordo com o ambiente. De acordo com uma geografia de tempos e climas. De acordo com o que a terra oferece, da vegetação silvestre ao que é plantado. Do que possa ter disponível para preparar um alimento. Com utensílios possíveis, com o tipo de fogo criado, do triscar de pedras ao uso de fósforos. E com tudo que é comível e comestível, e entrar na panela. No plantar e no colher, as danças e as cantorias. É com o cio da terra que se produz uma cultura, sem a necessidade de pegar um avião e ir na capital federal, com o pires na mão. Mendigar valores e obedecer critérios impostos, dizendo o que é e o que não é cultura.

Até mesmo Cascudo, o escritor reconhecido na sua terra, não estudou a cultura com grandes viagens. Pesquisou o comportamento do povo a partir de sua janela, e de suas caminhadas. Viajou pelo interior do estado, pelos trilhos do trem, dentro de uma locomotiva, movida a vapor, comendo bananas assadas na chapa da locomotiva, e tomando água quente. Não foi com terno e gravata que reconheceu e descreveu a cultura do povo. Não foi viajando grandes distâncias. O que precisava para suas pesquisas, resolvia tudo por cartas. E se questionados idolatram Cascudo.

Os governantes atuais desconhecem o uso de e-mail, de custo barato, requerendo tempo de escrita e leitura, reflexão de ideias e temas. Preferem viagens, para ver e viver coisas belas; rever parentes e amigos. Tudo pago com o dinheiro do povo. E dizem que fazem economia reduzindo salários, e postergando alguns pagamentos. Estão muitos ocupados em fazer viagens e ficar longe da prefeitura, longe dos problemas. No final do ano iluminam a cidade, para com o período de confraternização mostrar que ela é bela, a partir do uso das cores, com milhares de lâmpadas, que não são usadas ao longo do ano.

Não há como discutir cultura, de terno e gravata. De terno e gravata, posam para que disparem fotos, para contar as histórias de suas calamidades, tal como Pedro Abelardo. Em um futuro, colocam suas fotos com grandes empreendedores de pontos alcançados. E para reforçar a imagem da foto como mídia, não economizam esforços e valores, para produzir efeitos especiais, para colocar suas imagens em destaques, a partir de orientadores do estudo da imagem e da semiologia. O arquiteto de Brasília, já foi colocado em condições desproporcionais em uma foto, para o prefeito ficar em destaque, bastando ficar em pé, enquanto o idoso estava sentado, na idade que sua coluna já se encurvava. E uma foto de um tamanho enorme, foi colocada, cobrindo uma parede.


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Entre Natal/RN e Parnamirim
Em 24/11/2016

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terça-feira, 15 de novembro de 2016

Na Bodega de Militana

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Na bodega de Militana
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Na bodega de Dona Militana, a marujada se preparava para mais um embarque na nau Catarineta, bebendo vinho e acompanhando a apresentação de romanceiros, e da música com a dança do Coco de Zambê. E aqui uma liberdade artística e poética para mesclar expressões artísticas e culturais. A mesclagem de conhecimentos, informações mais outros tantos elementos, distribuídos no tempo e no espaço geográfico. Tema para excursionistas culturais, a partir do sistema “S”, (Severino, Sesc, Sebrae…) com as curvas na estradas.

E assim foi a viagem cultural dos alunos do segundo curso de folclore do estado do RN, completando uma carga horária, mesclada de informações e conhecimentos. Um aculturamento ao vivo, diante das apresentações dos grupos que antes combinados, aguardavam os excursionistas.

Com o rumo em direção ao sul partiram de Natal para visitar cidades vizinhas, onde é possível encontrar manifestações folclóricas por grupos culturais, pessoas que preservam histórias, ouvidas e contadas, ao longo do tempo. Embarcaram em um ônibus rodoviário, cobertos por apólices de seguros, e da TV Assembleia, que seguia com sua equipe a bordo. O registro de imagens e os depoimentos, para um futuro e outras tantas pessoas, pela telinha.

A oportunidade única, daquele momento, de ver ao tudo ao vivo, em um mesmo plano e com os pés no chão, sem palco e sem cobrança de ingresso. Sem muitos recursos tecnológicos. No estilo garganta, memória e capela. Foi a oportunidade de observar as expressões artísticas; sem a pesquisa e sem a formatação, com o norteamento acadêmico. Com e sem as teorias de um ou de outro, mestre, doutor ou pesquisador. E lembrando uma expressão comum ao fim das discussões entre Sartre e Simone,  “vocês estão enclausurados”. A cultura não se perde, não se faz, ela simplesmente acontece, e somos apenas seus elementos, sujeitos às suas nuances e vontades. O índio, no meio da floresta conserva sua cultura, ocultando-se da urbanização, que não passa de um controle de ordenação da população de uma sociedade, focada no desenvolvimento, sem observar o seu rastro.

A oportunidade de ver ao vivo, in loco. Sem um filme na tela com a visão e a descrição de quem narra, influenciado pela própria formação de conhecimentos e de cultura - do narrador - influenciado pelo que percebe e seus objetivos, o que percebe com seus próprios sentidos… Toda narrativa é influenciada pelo narrador, que insere seus pontos de vistas.

Os corpos dos pertencentes aos grupos, estavam presentes como uma mídia de conhecimento, com informações coletados durante anos, com o passar dos séculos. Seus gestos e suas vestes eram informação. A cultura tem suas estratégias, para passar por momentos impostos pela sociedade tecnológica e urbana. Por vezes ela se mascara e por vezes ela se oculta, podendo usar elementos de um momento atual. Para então surgir em outro momento, com suas raízes e seus comportamentos primitivos. Ela lida com o que encontra, é a sua persistência, a sua resiliência.

E a turma seguiu pelas estradas, Transpassou Parnamirim, Nísia Floresta e São José de Mipibu. Parada na estrada, para um embarque daqueles que vinham de Lagoa de Pedras, Monte Alegre e Salto da Onça. A companheira de viagem em cadeiras aos pares, era de Vera Cruz. Próxima parada, o primeiro destino. Senador Georgino Avelino, o menor município do estado. Formou-se um leque da maior cidade, a capital, ao menor município estadual. E a primeira apresentação, artística, folclórica, histórica e cultural, foi um estilo romanceiro, vindo de outras terras, desde a colonização, mas presente na memória, daqueles personagens em uma pequena cidade. Uma apresentação com músicas e falas que culminou com o romance de Juliana e Dom Jorge. E nos faz lembrar um tempo e um lugar que não havia rádio, nem televisão e nem mesmo teatro. Apenas representações para pequenos grupos que trocam de posições e de personagens, ora artista e ora espectador. E até coordenador das danças e dos eventos.

                                                      Comissão Norte Rio Grandense de Folclore
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Seguiram para Arês, com o antigo refúgio dos holandeses na Ilha do Flamengo. Foram recebidos pelo padre em uma igreja dos idos 1600. O padre contou histórias de portugueses e holandeses, do estado e da cidade, da religião e da política; história e geografia. Arês, a cidade que expõem uma arte, de um momento histórico, nos muros do cemitério.

Finalizado o contorno da laguna, com passagem em Goianinha, foi a vez de Tibau do Sul com a dança do coco. E não teve jeito, a jornalista chefe da TV Assembleia, largou o microfone que a atrapalhava seus movimentos, e os fios que poderiam se enroscar em suas pernas, aguardou ser convidada por meio de um componente “mengando” e caiu na dança ao som dos batuques com o zambê e o chama (tambores de pau furado), junto com a lata, como instrumento alternativo e de marcação. Era Cristiane, da terra da garoa, quem entrou na roda, e fotos comprovam o fato. O chama é menor que o zambê, tem o som mais agudo, e chama os componentes para dançar. Instrumentos primitivos e artesanais feito com formões e martelos. O dono do terreiro era Mestre Geraldo.
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A comitiva motorizada com ar condicionado, e de olhos abertos, partiu para outra cidade, com os movimentos internos  involuntários e roncos estomacais, para a próxima escala em Canguaretama. E foram baixar em outro terreiro, diria Cascudo. Saberes e sabores estão associados, fazem parte da cultura de um povo. Chegou-se então a um local amplo e arborizado, com piscinas de águas naturais, sem aditivos ou conservantes. O restaurante fazia parte do cenário, onde era possível começar um conhecimento com os olhos, o cheiro da mata e seus sons característicos. O primeiro conhecimento do homem com seus sentidos e suas atividades organolépticas.

Refeição rápida: bombordo, boreste e porão, foi o estilo da mastigação. O navio não espera, tem hora para partir, precisam cumprir suas escalas. Com o porão cheio, a escala derradeira, na praça da cidade, onde a nau Catarineta já estava atracada próximo a calçada, da praça junto à igreja e o mercado. Marinheiros a postos junto ao costado do navio. Oficiais já estavam no portaló para conferir a carga e a tripulação. Tinha capitão de gravata e capitão de corneta, mestre e contramestre, e o comandante era mar e guerra.

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E como é de praxe, primeiro as homenagens e condecorações pelos habitantes da cidade visitada, aos forasteiros que ali desembarcavam. E foram homenageados as lideranças da caravana, Rita, Severino e a Cascudinha, dá-lhe Ana! As apresentações artísticas e culturais aconteceram no cais improvisado para a nau Catarineta, que navega por mares e por ruas. O hobby e a diversão preservam uma cultura, onde grumetes já estão sendo encaminhados, pela prancha que dá acesso ao navio.

Apresentações desembarcadas e prático a bordo. Atenção senhores passageiros, queiram ocupar os seus lugares no ônibus. Todos a bordo e retorno ao local de origem. Mas o conhecimento gera outras dúvidas, outras teorias sobre outros fatos e outros elementos.

Durante a viagem muitas histórias foram contadas pelo guia, histórias que dizem ser lendas, não serem teorias comprovadas pela ciência e pela academia. Mas são histórias e lendas que se repetem, tal como as pesquisas da academia. A academia procura repetições para estabelecer regras que confirmem a fé na ciência, baseada em acontecimentos repetitivos.  E as histórias contadas se repetem em diversas cidades.

Histórias ou lendas de baleias foram contadas, baleias enterradas, que podem se revirar em seus túmulos. E até os dias de hoje muitas baleias ainda encalham no litoral potiguar. Algumas praias próximas a Natal, possuem rochas que lembram o esqueleto de enormes baleias encalhadas e  fossilizadas, mas a geologia contesta a hipótese. Mas quem sabe um dia, uma nova ciência ou pesquisa, se descubra que um dia em Eras remotas, enormes baleias ali encalharam, e com o vento empurrando as areias sobre seus cadáveres, se formam as dunas. E então justificaria-se as lendas, que se transformam  em história.

E alguém dirá agora, isto não passa de invencionice do autor, não tem fundamentação científica e o texto é apenas uma crônica, não segue as regras de um artigo científico. Mas também, os mesmos admitem que Cascudo era especialista em folclore e estudava lobisomens. Além de admitir que tudo que foi visto na viagem foi preservado e transmitido em memórias e movimentos do corpo. Os grupos exibiram coisas que não estavam escritas, apenas repetiram os textos e os versos, que viram e ouviram em outras épocas, e de outras pessoas.

Existem histórias que não foram registradas, ou grafadas, bem antes do descobrimento, antes de ser inventada a ciência. E pelo olhar da fenomenologia, proposto pelo matemático tcheco, Edmund Husserl (1859-1938),  a consciência não é um espaço vazio, e ela tem uma intencionalidade. Husserl propõe uma inovação na teoria do conhecimento.

Os indivíduos perpetuam a suas sociedades e a repetem quando necessário. E outros ainda diriam, que são coisas de Deus.

http://www.publikador.com/turismo/roberto-cardoso-(maracaja)/na-bodega-de-militana

Roberto Cardoso (Maracajá)
RN, 15/11/2016

VINHO*
Dom Jorge
Produzido com uvas do tipo Juliana
(*) Poucos entenderão a relação entre os nomes citados: Dom Jorge e Juliana. Então cabe aos interessados fazer uma pesquisa.

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